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domingo, 20 de janeiro de 2019
Conto da matemática do amor
Seja noite, seja dia. Caísse a tempestade abraçada à ventania. Voassem telhas cumbucas, pelos capinzais, pela cercania. Maria toda perfumada enquanto João não percebia. Carregassem com elas os vitrais dos olhos das cotovias. Levassem com elas as pétalas dos vestidos de fada da rosaria. Num canto Maria tão triste. Noutro canto João não sentia o desencanto. Rezadas as missas de todos os domingos, saltitadas nos fim de semana, vindas aos pingos; como manchas sinuosamente distribuídas no coro da saçurana. Maria balançava suas tranças, João nem aí. Carpidados os terços com todas as contas desfiladas nos dedos, distribuídas nas tantas horas da tarde arredia. Delirava Maria, enquanto João nem percebia o que a cigarra anunciava do verão. Nas rodas de dança, não há discrepância que a sombra não sigila para a noite que se aproxima do terreiro e da varanda; dando um toque de magia para a lua da vez. Maria dançava, João se distancia. Nas festas da padroeira enquanto desfilava o andor, com a santa admirada, rodeada de flores esperando seu cantor, geralmente um devoto, um fiel seguidor, com todas as suas oferendas e seus milagres de volta. Maria ia, ficava João. Nas festas de São João, enquanto a fogueira alcançava com seus fachos de fogo perene, o alto da cumeeira e de lá se adentrava pelo céu da ribeira, explodindo embaixo batatas e risadas de crianças. Maria rodopiava, por onde anda João? Por sob a pinguela corria o riacho, um verde tapete de ramos e pérolas, com seu som de violino repetindo a paisagem. Maria sentada na velha madeira de passagem, brincava com os pés tocando os lambaris. João nunca quis. Maria olhava as nuvens e nelas imaginava, os condes, as bruxas, as donzelas fiando em castelos distantes, em teares de ouro seus mantos nupciais. Muitas delas representavam branca de neve e os sete anões. João olhava só para chão. Mesmo assim nunca viu um anão. Um dia Maria partiu na garupa de um cavalo. O cavaleiro sorriu. Que venham as tempestades, as missas dominicais, os terços das ave marias. Ave Maria! Que se avizinhem as festas costumeiras, pois à beira da natureza os dois encontraram magia. O mistério desmatemático do amor. Que faz dois ser um. Que faz um ser dois.
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