Conto do sucesso

Nestes momentos sempre acontecia algo de espetacular, aliás, por onde ele passava o mundo se enriquecia de conhecimento e sabedoria. Andava o grande sábio Al Ammar pelo mercado da Medina, local por ele muito amado, onde encontrava sempre seus velhos amigos, comprava também suas frutas queridas como cerejas, tâmaras e figos, assim como triguilho e hortelã para kibe, tomate, cebola e tahine para esfirras, chanchice e zaatar.
Um antigo companheiro seu de caravanas apontou para um canto à direita de uma fileira de lojas, onde um mendigo sentado no chão, vestido de trapos, pois assim se transformara seu gafirah com a agal e até mesmo os ratos haviam roído sua kandura e sua na-al e pedia esmolas a todos os passantes, “veja lá Al Ammar, aquele pedinte, quem poderia imaginar que um Sheik chegasse a tal condição? Ele duas vezes Sheik, pois além de herdar a chefia de um grande clã patriarcal, ainda assim terminara todos os estudos islâmicos, e olha em que situação está! Por que um homem fica nesta condição quando todas as possibilidades estavam ao seu favor desde o seu nascimento?”
“Meu amado amigo, as possibilidades estão ao favor de todos nós sempre! Veja este maravilhoso sol da manhã dourando tudo ao nosso redor! Eu conheci o Sheik Aziz ainda em seu esplendor, mas sabia que perderia tudo em pouco tempo, por três atitudes que podem trazer maldição e desgraça a qualquer ser humano! A primeira delas é maldizer-se a si mesmo. O Sheik Aziz sempre que lhe acontecia algo, ele dizia que era um infeliz, que não tinha sorte, que ninguém gostava dele, que o mundo era ingrato com ele! Quando a alma do ser humano se volta contra si mesma como um profeta do caos, meu amigo, tudo começa a se perder. A segunda coisa eu presenciei várias vezes quando o visitava. Durante as refeições ele jogava restos de pão ao solo, pois seu alimento sobrava em quantidades na mesa! O alimento é sagrado e quando se o menospreza é como cuspir na face do Criador! A terceira mania do Sheik Aziz era profanar o dia a dia. Ele no afã de ganhar muito dinheiro em seus negócios sempre dizia que naquele dia não fora suficientemente feliz por ter alcançado os lucros almejados! Ele amaldiçoava também cada dia de sua existência, sem levar em conta que cada dia é uma benção do Criador para todos nós!” E tomando as mãos de seu amigo por um beco a terminar em uma pracinha com um chafariz, Al Ammar levantou as mãos ao céu e disse, “ amigo, louvemos ao Grande Criador que tudo nos deu, que nos faz feliz todos os dias, que nos traz tudo o que precisamos, que nos abençoa por onde passamos, louvado seja sua glória sobre nós! Amigo, louvado seja este dia tão lindo que brilha como vitrais com os raios da luz do sol e bendito sejam todos os dias de nossas vidas!” E enfiando a mão em seu alforje retirou um pedaço de khobz para si e outro para seu amigo, “amigo, comamos cada pedaço de pão que necessitamos com a alma agradecida ao Criador pelo pão nosso de cada dia e comamos o suficiente que nos sacie a fome e não joguemos nenhuma migalha dele fora”.
Enquanto dois vultos desapareciam entre as ruas da Medina, realmente o universo vibrava de luz e amor por todos os cantos onde passavam!