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segunda-feira, 30 de setembro de 2019

Você 51

Hoy es lunes. Yo quiero ofrecerte una ramita de flores que está en el pico de mi pajarito cantante.
Quiero ofrecerte un rayo de sol sólo, pero que sea suficiente para llenar tu alma de luz y color.
Y veo allá en el fondo azul del cielo una nudosa azul que deseo que sea de ti. No es mucha cosa, pero es lo necesario para hacerla sonreír.
Y hay un camino de sueños adornado de margaritas y perfumado de incienso donde podrás andar y descubrir la sagrada fuente de la vida, no es mucha cosa tampoco, pero es suficiente para saber quién eres.
Es el camino del corazón. Mi pajarito cantante va delante de ti, enseñandote los pasos por las piedras de este camino. Hoy es lunes y mañana es martes. 

Y aun siendo mañana, estaré contigo en el cantico eterno de mi pajarito sagrado.
Hasta siempre en todos los amaneceres de nuestra vida. 

Tú eres mi amor soñado, tú eres mi sueño amado.

sexta-feira, 27 de setembro de 2019

Você 50


Naqueles tempos antigos os marotos namorados
mariscavam quadrinhas às suas garotas queridas,
não eram manuscritos seus versos, eram digitados
de mãos dadas andando em noturnas avenidas!

Mantos caindo aos ombros compondo bordados,
nos cabelos retorcidos da menina em laços de fitas,
enquanto se percebiam movimentos sombreados,
com  cestos de vime sorrindo vinham as floristas!

Os tempos nunca se vão, se românticos os vivemos
com todos seus esplendores e com todos fulgores,
se realmente formos donos do tempo que temos!

Basta sonharmos, tendo em toda alma esta magia,
pintar a tela de nosso mundo com todas as cores,
vivendo aqueles enamorados, mesmo hoje em dia!

Você 49


Tenho um espelho mágico, sublime, precioso,
fica impávido adoçando minha sala de espera,
difícil explicar ao trágico olhar de um capcioso,
o que ele esconde hiperbólico em sua esfera!

Deixei-o lá no canto mais leviano e formoso,
mesmo venha quem diga ai quem me dera
descobrir o escondido neste meio charmoso!
Não sabem que escondi nele uma linda fera!

Guardo uma tigresa bela de uma espécie felina
rondando no âmago estranho deste espelho,
somente eu tenho firme a ponta deste novelo!

Porque ele é o traçado de um labirinto oposto,
onde te amo perdidamente em distinto enredo,
misturo-me em teu corpo, colado, rosto a rosto!


Você 48


Densas ficam-me todas as rosas ofertadas,
encolhem seus suaves perfumes nas alcovas,
de suas folhas secas, pálidas e descoradas,
sejam sob todas as luas, mesmo luas novas!

Pétalas se derramam contorcidas, desfiguradas,
avisam que tudo é breve em suas boas novas,
descem ao entorno da jarra, pálidas, desoladas,
mas surgem-me versos com proféticas trovas!

Vão-se as rosas, nosso amor, este permanece
solene, sutil, os meus braços em tua imagem
tão perfeita e bela, tocam o que a mente tece!

Desfalecem os perfumes das rosas despetaladas,
mas não se vão os sentidos de nossa linguagem,
dos nossos suspiros amados em taças ofertadas!

terça-feira, 24 de setembro de 2019

Vc 47

Não sou corretor de como fazer o amor,
não tem como trançar o que nasceu feito,
não sou pintor ousado a mudar sua cor,
sei cortejar a levedura do amor perfeito!

Não sei como por mais lenha neste ardor,
fogo permanente ardendo sem preconceito.
Só sei esculpi-lo no jeito em sublime calor!
Tesouro latente no lado esquerdo do peito!

Jornada incessante, chama que me invade,
me ilumina, me fascina, me deixa em porre!
Quando evasivo se transforma nesta canção!

Amar é concebível como uma lendária cidade,
sendo o amor imperativo vigia de sua torre,
em cada curva de suas ruas, uma nova paixão!


Já que não posso carregar uma cruz 
como aquela que Cristo carregou por mim,
que eu pelo menos faça jus 
de ter uma alma tão leve,
como a mão da primavera 
escreve cada jardim!

segunda-feira, 23 de setembro de 2019

Vc 46


Somos duas metades aparentes,
pois somos somente um!
No dia em que nos encontramos,
percebemos que não há outra
alma em lugar algum
que busca o que buscamos
e quando se encontram,
se adentram, se tornam tangentes!
Foi o que descobrimos,
quando nos mergulhamos,
em nós mesmos e naquele
momento todos os relógios
pararam espantados, pois
pelo tempo passamos.
Foi assim quando nos vimos
naqueles segundos congelados
lembrando a templos antigos,
belos pelos momentos por
nós contemplados sob as luzes
das velas em castiçais,
sobre os rolos de pergaminhos
que eram nossos abrigos
das grandes mensagens universais!
No dia em que nos encontramos
nada foi mais equivalente do
que aquele fantástico encontro!
Não há como explicar!
Nem dizendo que o céu
beija o mar.
Nem dizendo que as
ondas na praia sabem rendar!
Nem dizendo que os
pássaros dançam no ar.
Não há palavras que possam
explicar, não há números
que possam datar,
quando minha alma perdida,
sem querer se viu naquele
encontro e sua alma meio
embevecida, viu-se assim
de repente em minha alma
refletida, enquanto me
lembrava de um grande conselho
que um Mestre havia me dito:
“A outra sua metade é
como se ver no espelho!”

domingo, 22 de setembro de 2019

Vc 45


Se uma dama tão bela
igual a ti, gostasse de mim,
as flores iriam despencar
todas as pétalas no jardim,
pois delas me esqueceria.
Se tu me amasse profundamente,
eu sairia como um andarilho
a todos tirando o chapéu.
Com certeza eu andaria!
E cada estrela no céu
de ciúme murcharia
por perder seu menestrel!
Eu aprenderia finalmente
a lição que o amor ensina,
se nos amássemos realmente!
Nem sei te dizer menina,
qual seria o melhor presente
que alguém encontraria
embrulhado neste papel,
que a vida assim ofertaria
como um sonho do céu.

Vc 44


Sou dono de um moinho
esquecido pelo vento!
Ninguém vive sozinho,
ninguém vive de pensamento!
Tenho grande possibilidade,
ela está bem escondida,
com sua força de vontade,
ela poderá ser erguida.
Procuro pela alegria
que anda tão esquecida,
ela será plena poesia,
por você na minha vida!
Tem gente que quer um abraço,
tem gente que quer um carinho,
tem gente que se diz um pedaço,
um pedaço de bom caminho,
pensando em você, eu passo
a pensar com sentimento,
você é o caminho que traço
como um carinho por dentro!

Primavera

Sobre os sóis da primavera, agora o que eu digo? 
Sejam flores pelos caminhos, brilhando com todas as cores,
bailando pelos cantinhos! 
Em cada covinha do rosto, um sol nascendo, outro sol posto!
Os sóis outonais também tem seus frutos, são sóis pendurados em arbustos; 
tais como em vultos são debulhados sorrisos ou como em rostos são desvelados os sustos!
Os sóis invernais nos dias de densa neblina, nem bem sei o que digo! 
Pois junto à neve na colina ou seus raios transversais deslizando sobre os telhados, 
dá-nos um frio no umbigo!
Os sóis do esperado verão para muitos amantes do mar ou dos passeios praianos, 

destes sóis muitos terão às claras sonhos insanos! 
Deles nem é bom contar, Ó meu Deus quanta ilusão!
Sobre os sóis da primavera? O que dizer então?
Muito pouco a dizer, somente receber seus raios e suas flores
no jardim de nossa sala de espera dentro do nosso coração!

sábado, 21 de setembro de 2019

(De)cisão

Bata poeta na caixa de fósforos,
a música da tua poesia, para que os fósforos acendam poemas nos homens comuns.
Olhe poeta além da tua janela, a cor que brilha o dia, para que sua luz ilumine as almas dos homens comuns.
Folha que corre no rio, mesmo que a leve o rio, muda a visão do rio.
Passos que caminham mesmo descompassados, ou que estejam sozinhos, mas que por si mesmos caminham, mudam as margens do caminho.
Não se importe poeta que alguns se incomodem com a sua presença.
O que mais importa poeta é que você faz a diferença!

sexta-feira, 20 de setembro de 2019

Você 43

Eu comigo sou ilha, 
sou terra de onde vim, 
rodeado por "mim". 
Mas de mim não desvencilha 
seu cheirinho de carmim. 
Desta forma você me salva
de ser só "mim".
Sendo assim envolto em ti,
sou colibri do seu jardim!
Eu contigo sou tudo, sou eterno, 
sou lúdico. Se te abraço vou mais fundo 
e no laço deste amasso, eu abraço o mundo! 
Eu sem "ti" fico triste, fico mudo, fico "sem". 
Mas contigo, sou bem-te-vi como na saudade
te vi e ao querer te ver tão bem, contigo eu fico zen!

Você 42

Gostaria de desvendar o segredo íntimo do sono,
uns dormem enquanto outros ficam acordados,
alguns deslustram muitas formas em abandono,
outros deslumbram pensamentos encaracolados!

Quando a cama se revira em um comboio insano,
mirando os pântanos da noite presa em cadeado,
cirze de um lado ou do outro a costura do pano,
quanto mais se costura, mais o pano fica rasgado!

Breve neste universo é tudo que passa a contento,
como se fosse um suspirar, uma vela que se sopra,
neste ir e vir incessante de cada forma pensamento.

Perder o sono é  ficar ausente, ser avesso de sonhar?
Seria recolher-se, ficar pensativo como fruto na copa,
você toda radiante, maravilhosa, sol da noite a brilhar.

domingo, 15 de setembro de 2019

Poema distante

O que há de
mais profundo
mesmo neste
mundo é o
fundo do
fundo do poço!
Não há pior
situação.
Nem Raimundo
poderá encontrar
uma solução.
O fundo do
fundo é tão
profundo que
que seu teto
é um calabouço!

Milagre da procissão

A pequena fila do cash, caminhava lentamente e mexia como uma preguiça, mas num segundo, lá na sua frente, ou sua cabeça, deu um bote rápido, como uma cobra jararaca. A mulher digitou num flash de segundo e num lance manual de mágica, sacou mais rápido que John Wayne, saindo em passos de sete léguas e voltando mais depressa do que nunca, com as mãos na cabeça e dois homens com revólveres sobre ela, que sacaram mais rápido que Durango Kid nas antigas matinées de cinema. O mais rápido no gatilho é quem vence a parada no moderno faroeste. No antigo faroeste também era assim. Os homens abaixaram imeditamente as portas de aço, aos gritos, "venham e fiquem aqui neste canto, pois vamos explodir os cashs!". As pessoas se amontoaram todas ao lado de uma balança, uns abraçados aos outros, tipo futebol americano. Porém, uma velhinha retrucou: "moço, deixa eu tirar o meu dinheiro da aposentadoria primeiro!". "Fica tranquila, minha véia que nóis damu o dinheiro em dobro, véia!" A explosão jogou latas pros quatro pontos cardiais do mundo. A velhinha suspendeu os braços pra cima e bradou: "me valha meu querido São Benedito!" Mal a porta de aço abriu e fechou por fora, todos abriram os olhos pra fora e por dentro. A velhinha contou com a ajuda de uma jovem e finalizou: "dois mil e quinhentos reais! Quatro meses em um só!" Total dos maços de dinheiro em suas mãos. "Quatro meses, não!" Respondeu um senhor tremendo seu barrigão. "São cinco vezes, pois a senhora não recebeu a aposentadoria ainda!" A velhinha retrucou: "Ah! É assim? De agora em diante vou fazer plantão em tudo que é cash por aí!" "Pois escute, minha senhora, São Benedito não explode cash todo dia não!" São Benedito coisa nenhuma, estes bandoleiros deveriam ser chamados de The Flash, para rimar com Adeus Cash, são todos os novos cangaceiros da modernidade. Os antigos reis do cangaço, ou destemidos jagunços do passado faziam o sinal da cruz antes de cometerem seus crimes e distribuíam suas rapinagens robinhoodamente com todos os necessitados, os famigerados explorados pelos senhores de engenho, fazendeiros feudais cruéis dos brasis rurais. Eu pessoalmente conheci muitos pistoleiros e todos eles tinham o corpo fechado e protegido por algum patuá ou santo devoto. Os modernos salteadores conjugam o sinal entre o pavio e a bucha de TNT. Trinitrotolueno sabotado entre os direitos de uso e regalia de uns e distribuição clandestina de outros. Na época do enlatado, do pré cozido, do instantâneo, parece-me que dinheiro enlatado não dá certo de forma alguma. A não ser para uma velhinha...devota de São Benedito!" O milagre veio com atraso de oitenta anos de jejuns, orações, promessas e infinitas procissões.

O Rei da Cocada Preta

O cassino ficava bem prá lá um pouquinho da escuridão do fim da rua. Não era cassino, mas fica sendo, uma vez casa escondida de jogatina, depois da curva do rola grana, embora neste país não seja liberado à Las Vegas. Como o serviço aumentou demais, o proprietário, um jogador viciado e explorador, colocou um anúncio de emprego: Vigia de Salão, paga-se bem (não disse salão de quê, até pudera tendo em vista o pudor e o segredo). Apareceu um cara grandalhão com cara de Zé ou de João Bobo e conversa vai, conversa vem, fico mesmo no mínimo, desde que tenha liberdade completa de circulação e vai e vem. Mauro, o tirado a esperto, quase caiu pra trás, ou melhor, em cima de uma máquina de caça dólares, pois daria até cinco mínimos no máximo, como propina do cala-te boca, ninguém viu nada por aqui. Mas o novo empregado se contentava mesmo é com o mínimo e não fez cara de touro pelo consentimento. A noite rolava e banhava no dinheiro, mesmo que a lua fosse de prata, lá dentro brilhava no ouro. Mauro ia juntando sua fortuna e bebendo uisque, como bode faminto come palha seca. A madrugada chegava com os jogadores se retirando no relincho dos carros queimando o breu. Muito Estranho, nome ou alcunha adquirida nas horas de circulação, sentava-se numa mesa ao canto e Mauro embriagado quase se afogava na cortina esvoaçando ao vento. "Vamos apostar seu Mauro!" "Tô dentro!" "Rodada de quinhentos!" "Rodada de mil!" "Rodada de cinco mil!" Muito Estranho só ia embolsando as centenas de apostas, enquanto Mauro cambaleando encontrava pelo santo da sorte, seu quarto de dormir. A rotina é sempre a mesma. Nada muda naquela casa entalhada a filme de horror. Os mesmos jogadores, a mesma bebedeira de Mauro noite adentro. Mauro não suportava a solidão e aguardava ansiosamente o empregado para ganhar a madrugada perdida na aposta adentro. "Rodada de dez mil!" "Rodada de cem mil!" "Rodada de duzentos mil!" Um ano passou tão rápido que Mauro nem percebeu toda a sua fortuna escorrer entre os dedos de suas mãos. Não vai mais além de um simples bebum da última esquina depois do grande fracasso. Muito Estranho, muito estranho coisa nenhuma, vamos direto ao seu nome de guerra, Mr.James, como já era conhecido há anos nos cassinos mais invisíveis da América, agora proprietário desta casa de jogos, comprando os dois terrenos ao lado, em fase de ampliação, não bebe, não fuma e muito menos dorme no ponto.

Unha e dedo

Nasceram no mesmo dia, mes e ano, porém em cidades diferentes: um na cidade grande outro na cidade pequena, tão pequenina para o seu almofadado coração. Nomes? Com certeza diferentes, para não colocar de molho nem a quarar a situação: Boni e Carlos. Fizeram o mesmo vestibular, com notas diferentes, se não seria demais e ambos da mesma sala desde o primeiro semestre do curso de Artes. As notas também nunca foram iguais, pois Carlos era mais detalhista, perfeccionista e se entregava de alma, assim como de corpo às mirabolancias das Belas Artes. Amigos para sempre, porém o destino tem cada detalhe.... Boni, reservado, mais para pérola entravada do que para concha, gostava do curso, embora recluso no seu mundo interior e na sua dificuldade, ou quem sabe inabilidade neste universo renovado e globalizado das relações múltiplas. Carlos, podemos dizer era totalmente diferente, pois sua amizade chegava a gengis clã. Vou explicar direitinho: era tão próxima a todos, quase tocando boca-boca. Ele sim, podemos dizer, naquele mundo artístico, o tarimbado, prendado e dado desde o clássico ao surreal. Neste universo e à parte as diferenças, os dois se tornaram grandes amigos. É bem provavel, nesta aliança amigavel, tenha contido uma grande pitada do tempero de Carlos. Boni se entristeceu de vê-lo morando em um quarto alugado, com cheiro de vaso sanitário velho, torneira pingando na cadência de uma pia antiga e convidou-o para morar em sua casa, levando em conta a assinatura embaixo de sua bondosa mãe. Assim, Boni e Carlos estreitaram com mais profundidade os seus laços afetivos e emotivos. Estudavam juntos, planejavam juntos, faziam trabalhos juntos e não há coisa mais bela neste planeta que cada um para o outro e o outro para cada um. Na rua? Na passarela? No centro acadêmico? Na primeira fila da sala? Vocês já sabem a resposta: Boni e Carlos! Quem preparou a Mostra Dali? Quem fez o sarau Picasso? Quem estava por trás da Mostra Cultural? Boni e Carlos! No Centro de Artes pensaram até em introduzir um pronome interrogativo em español: "quiénes". Andavam no mesmo passo, o mesmo tipo de roupa, o mesmo sorriso, a mesma coca-cola. Mesmíssimos ou mesmissíssimos era o apelido dos dois. Os anos se passaram. Eles se formaram. Construiram um segundo andar sobre a casa da bondosississima mama. São donos de uma empresa de objetos antigos e artísticos. Possuem o mesmo carro. Já não são mais aqueles jovens estudantezinhos Boni e Carlos. Para todos, eles são Bonnie e Clyde! 

Palavra vociferada contra si mesmo

Seu Marcolino descompassava cof! cof! cof! numa tosse intermediária a um bocejo prolongado, com um chiado no centro do tórax. "Você precisa de ir ao médico!", vociferava mil denares de vezes, Dª Martinha. A papagaia no poleiro já decorara o refrão: "ir ao médico! ir ao médico! ir ao médico!". Dotes femininos. De tanto ouvir, não é que o homem foi? Foi, mas por lá ficou. Internação imediata. Operação urgente. Coração de um motoqueiro! Um corte de trinta centímetros ao longo do peito, mais um transversal. Visitas marcadas no ponteiro do relógio. Dª Martinha falava todo dia no pastor: "o homem ora como ninguém! Marcolino, abra o teu coração pro homem entrar!". Ele só respondia soprando: "Já abriram meu peito. O coração não é meu. Tanto prova que não gosto de goiabada!". Pra não ouvir mais sermões, Marcô cedeu. Fez um sinal suave com a mão. No outro dia, Pastor Isaías baixou por lá, de terno, gravata e uma bíblia debaixo do sovaco molhado a solavanco de condução. A reza foi funcional, pois Marcô cochilou debaixo de seus antibióticos. Martinha só balançava a cabeça e subia nos calcanhares. Terminada a ladainha evangélica, Pastor Isaías começou a olhar, com um semblante estranho por todo o quarto. Observou demoradamente os armários. A cama do acompanhante e uns chinelos embaixo. A porta semiaberta do banheiro e um odor de hipoclorito de sódio vindo do vaso. Marcô assustou, acordando do sonho e perguntou: "O que o senhor espia tanto aqui?" "Eu tive uma revelação meu caro! Eu vi um caixão saindo deste quarto!" "Deixa disto, seu pastô! Daqui vai sair um homem a cem quilômetros por hora, de coração novo!" "Mas eu vi um caixão, e vi também um par de castiçais enormes, com velas cheirando a defunto!" "Pára com isto, Pastô, tô fora desta tua maldição!" "Vejo também flores brancas de velório, com muita gente chorando!" "Sai desta, meu! Vai blefar em outro canto!" O pastor deu uns passos à frente e abaixou para continuar falando baixinho no ouvido direito de Marcô: "a morte tá chegando!" Marcô com passagem comprada de vinda e ida a um sonho montado num cavalo de batalha; apanhando um litro de água benta cheinho sobre a mesinha, aparentando uma lança de prata, arrematou-o na cabeça do Pastor! Marcô dormiu de novo. Pastor Isaías caiu no chão. Martinha a mil foi buscar assistência e socorro. Duas horas depois o corpo do pastor estava no necrotério se preparando para o enterro no dia seguinte. Revelação realizada na ponta da língua e no fundo da garrafa!

Dama

Quando eu a vi naquela janela com os olhos mais abertos que o mais aberto de todos os girassóis, eu perguntei às mulheres da vida o que havia passado com aquela dona cujo olhar batia em mim como ondas batem à beira das pedreiras íntimas de mares longínquos e as mulheres que vendem seus corpos por tostões suados me disseram que há muito ela passava os dias de sol quente a mirar luas cheias no coração do sol!
Nunca vi tanta filosofia em tão surradas palavras! As palavras são como os doces das cristaleiras que só ganham valores quando por meninos arteiros são furtados às pontas dos pés, pois, enquanto são repartidos aos sabores dos dias mesmeiros entre adultos risonhos não alcançam horizontes alguns!
Portanto, foi um beijo, um beijo tão ousado de um aventureiro que começou em seu rosto tão sofrido, esquecido, vendido e maltratado, esponjeado de pó de arroz do mais simples e vendido nas vendas das estradas e que desceu pelo seu rosto, por sua boca muda que não havia ainda soltado um suspiro de verdade.
Desceu por seu corpo, adentrou-lhe para sempre em sua lembrança e daquele dia em diante sua janela não via mais o panorama de antes para uma rua dos prazeres dos outros, dos marinheiros cansados, de uma ou outra mulher que às vezes mudava de casa, na esperança que do outro lado houvesse mais ambulantes, pois, ninguém superaria aquele momento e que não valeria mais a pena vender seu corpo, pois não tinha mais nada a receber.

sexta-feira, 13 de setembro de 2019

Caso fora do comum


Esta extraordinária estória interiorana, fato verídico, registrado em cartório e documentado sob as vistas de todos, merece análise acurada, pois transcende esta existência pela sua peculiaridade surreal. Exige de início que nos localizemos geograficamente mesmo de forma simples e temporalmente, pois espaço e tempo são imprescindíveis na explanação de tão estranho acontecimento. A cidadezinha surgiu há tempos de bandeiras e entradas, à beira de um rio, lá no fundo úmido, frio de um vale silencioso, embora tenha rumorosa notícia até aos dias de hoje o fato sucedido. Naquela época sombria ainda era relevante a profissão de sapateiro, portanto Sr Renato Recoreco, então como era conhecido pelo estalar da lixa diária nos couros endurecidos ao sol, trabalhava proficuamente neste ofício, atendendo seus clientes, sempre cabisbaixo, cortando algum tecido, ou pregando algum solado, apenas sussurrando meia dúzia de palavras, forma tal que durante uma vida inteira só conseguiu realmente reunir em torno de si, apenas quatro amigos, este número é de suma importância neste caso, pois sua significância surgirá no final do mesmo.
Certo dia, sempre de cabeça baixa, acostumado àquelas estradinhas de um fio só contornando pastos, somente quando em vez uma coruja piando em um canto ou um passarinho pousando bem à frente, mas sem nenhum outro incidente para descompor aquela monotonia; assim como sempre, ou não desta vez, ao atravessar a rua em frente à sua sapataria, foi inusitadamente atropelado por um caminhão a mil, por incrível que pareça, por ali só passava também de mil em mil anos, mas passou, jogando-o sem vida à beira da calçada, sob atônitos olhares, alguns debaixo de seus chapéus suados, outros acima rogando bênçãos a Deus.
Somente seus quatro amigos providenciaram seu velório e enterro, afinal de contas, quatro seria o mínimo máximo comum necessário para tal empreendimento, sendo que o caixão tem quatro alças. Assim foi feito, sob as lástimas apenas de quatro rostos rolando lágrimas e lembranças antigas.
O cemitério ficava lá em cima daquele morro, sim, aquele lá no alto do povoado, o mais arriba como todos falavam, como se os mortos pudessem ficar mais perto de seus santos padroeiros. Para lá se dirigiam seus únicos quatro amigos, um deles com um atestado de óbito manuscrito, pois caso aparecesse algum parente seria útil apresentá-lo, pois este morto, ou seja, primeiramente morto, não tinha parente algum apresentado e morava sozinho nos fundos da sapataria, descalço de qualquer companhia.
Nisto aconteceu o maior fenômeno daquele mundo ignoto.  Outro caminhão vinha naquela direção e desgovernou. Notório afirmar aqui que estes caminhões se dirigiam para aquelas bandas naquele momento para comprar café, pois houvera uma crise nesta área comercial e os mais experts no ramo partiram para locais distantes em busca do ouro em grão arábico.
Assim, o caminhão atropelou do quádruplo ao quíntuplo o estranho grupo, matando os quatro únicos amigos de um único morto que desta vez morrera pela segunda vez!!!
Como sempre o Padre dá um ponto final nas estórias esdrúxulas da roça e exibia a todos, o espetacular Atestado de Óbito que mandara fazer. Atestado de Óbito fora do Comum: Faço saber a todos e a todas, curiosos, fofoqueiras, ou sabedores de última hora que de certa forma a morte foi inicialmente de quatro, pois de quinto fica difícil, sendo que o quinto já se encontrava primeiramente morto e tornou-se remorto, ou seja, morto pela segunda vez. Que Deus cuide da alma do Sr (Re)Renato (Re)Recoreco, uma vez que seus quatro amigos eram desconhecidos da nossa comunidade e segundo os mais cônscios, já habitavam algum lugar naquela região do Campo Santo.

quinta-feira, 12 de setembro de 2019

Poeminha engraçado


Só de pensar que gramático
não come grama e que
patético não faz graça alguma,
vou me agarrar à rama de uma
abobreira para não cair de
altura nenhuma.
O lado de lá é confuso.
Pois é lá para quem está cá
e é cá para quem está lá.
Um dia e meio é obtuso.
Pois um dia se vive ao inteiro
e meio, como cortá-lo?
Onde está o carpinteiro?
O que pode ser mais louco?
Viver o dia inteiro no sufoco
ou ouvir a toda hora, “espere um
pouco!”
Por mais que se espere,
o cronômetro não para
e a hora nos devora!
Tem gente que não vive,
passa.
Eu gosto mesmo é de rir.
E só rio quando acho graça!

Poema indubitável


Há encontros que são
desencontros!
Como há tantos,
tantos todos os dias!
Há encontros que
nos deixam tontos,
pois são sincronias!
No dia em que te
encontrei,
nem estava pronto!
Estava penteado?
Estava bem arrumado?
Não sei! Não sei,
pois fiquei tonto!

A Grande Ideia


Nenhum trapezista saltou além de mim!
No grande circo do relógio das horas não sei quem badalou primeiro!
Nenhum malabarista movimentou-se mais rápido além de mim!
No grande palco das mágicas perfeitas, todas as possibilidades
são nulas e ao mesmo tempo sujeitas!
O último será sempre o primeiro depois de mim! Tudo foi um sonho dormido nas rendas do travesseiro!
A curva do salto foi um grande sinal de interrogação! Para onde foram todos então?
O movimento tão rápido passou como um clarão! Para onde foi
a expectativa da ilusão?
Os meus amigos e as ruas noturnas do cais. Os livros, o Neruda que você não leu e não lerá mais! As idéias? Bem, estarão ainda no ar?
Mas estas outras e aquelas que sufocaram antes de ocupar o mesmo lugar?
Só tenho esta certeza de que há um fogo que não pára de queimar e não se queima também!
A Grande Idéia é uma sarça ardente permanente no deserto da
Imaginação.
De todas as coisas só tenho a certeza que daqui a pouco será ontem!

quarta-feira, 11 de setembro de 2019

Visão


Põe-se a amar, seja por qualquer encontro,
seja por qualquer encanto, mas um dia
tudo tem fim, triste quando o fim seja o pranto!
Mas o sol nunca se deixa levar! O sol não se põe!
Em cada céu deste mundo há sempre um sol a brilhar.
Mesmo se o jantar é de gala,
põe-se a mesa e depois se retiram
os pratos, a toalha bordada, os comensais!
Se é necessário discurso, põe-se a fala
e depois se cala!
O sol nunca se retira e nunca se põe!
Está sempre a brilhar seja diretamente
ou com seus raios transversais!
Põe-se a roupa e depois a coloca para lavar.
Coloca-se os sapatos e depois os coloca nas sapateiras.
Tudo que estamos a guardar um dia
será retirado das prateleiras.
O sol é o único que nunca se bota a quarar!
Em cada céu deste mundo há sempre um sol a brilhar.
A mãe penteia a menina e se lhe coloca uma fita.
Um dia este menina coloca outra fita
em outra menina bonita, tudo passa, se põe!
A infância se põe, a juventude se põe, os amigos
se põem, a fortuna se põe nem que seja em outras mãos!
Tecem novas filosofias, mudam os pensamentos e
surgem novas ideologias.
Tudo é como no Eclesiastes, “tudo é como correr atrás dos ventos!”
O sol nunca se põe! O sol está muito acima dos ventos!
O sol está além de todas as maresias!


terça-feira, 10 de setembro de 2019

Sabedoria


Ter coragem e não ter medo?
Não! Não é só este o meu segredo!
Sabe seu moço, meu segredo está
naquele meu poema do salto sobre si mesmo!
Só é possível dar este salto, quem
conheceu o fundo do poço!
Somente aquele que chegou à sua borda
e percebeu que a existência não é bucólica!
Só é possível dar este salto quem
subiu sem corda e ainda sobre a borda
do poço construiu uma ponte simbólica!

Salto quântico


Sou mais um entre os poetas!
Sou (mim mesmo) caindo de para-quedas!
Sabe menina, cair em si mesmo é dar um salto
sobre o abismo entre o si insano e o per si do
senso comum, continuísmo cotidiano!
Por este aspecto sou mais que qualquer um!
Qualquer um quando é um nenhum (qualquer)!
Salto longo e esplêndido sobre a piscina cósmica!
Vou além de todos os ismos de todos os sistemas,
vou com meus silogismos cosmogônicos decifrando seus teoremas!
Visto o avesso do pano que exterioriza este mundo absorto.
Cada hipérbole que faço é tão numinosa que alcança a dança
do outro.

Despedida

O último self à primeira vista parece o olhar do outro
sobre aquele rosto gélido! Um flash de dor por dentro.
Não é a câmera do celular que flagra o último momento!
Seria um selfie pálido e cinzento. Uma coisa é por si, outra
coisa é de si para si mesmo ou para a mesmeira do outro.
Não é por vontade do morto que se jaz assim postado ante 

uma retina cintilante, ser deste jeito fotografado!
Sob as asas intermitentes pela curva suspensa dos cílios paira

 incólume um ser estirado enquanto a pouco era gigante!
Assim em paz ali deitado, a vida se reduz em breve instante

 e dos amigos em volta um punhado!
O último self é o olhar onde o onde e o quando se perdem 

naquele meandro, quando não há nada mais a levar!
Nem mesmo cada olhar! Um self fora de si! A inversão do selfie!

segunda-feira, 9 de setembro de 2019

Ressurgimento

Não é inteligível correr 
atrás dos ventos! 
Aliás, é uma lição 
eclesiástica da 
momentaneidade 
da vida!
Mas é plausível correr 
atrás das borboletas! 
Aliás, não é para prendê-las, 
mas para apreendê-las!
É uma lição elástica da 
possibilidade 
da vida!

domingo, 8 de setembro de 2019

Resposta a um enigma

Seu nome verdadeiro era Fortunato, mas por certidão de aparência registrada no cartório da percepção popular: Carlitos. Sem tirar ou colocar mais nada. A cara de um, as atrapalhadas do outro. Não tanto como o outro, mas sentia-se quase realizado, no seu mundinho pé de serra. Apesar da alcunha Carlitos, de um dos mais respeitáveis cômicos ou palhaços de todas as eras, uma angústia o atormentava. Ah! Você não sabe a ninhada de andanças que está debaixo deste "quase". Filhos criados, embora malcriados, cafezais esverdeando colinas, paióis engordando ratos, galinhas botando pingue-pongue de ovos no vento de tanto sobrar. Arreios novinhos em folha, somados a conjuntos de esporas, estribos e barrigueiras, com chicotes cravados de prata, tudo em dia. Brilhava pedacinhos de ouro em seus dentes! Porém, aquele "quase" era o todo vazio de sua vida, tal fresta em veneziana por onde o vento noturno incomoda. Aquela dúvida antiga cor da meninice, ali estancada em sua mente: Onde nasce o sol e a lua? Onde nasce o sol e a lua? Esta, a sua pergunta inquietante "ões" de vezes. Tudo já estava preparado para a grande viagem em troco da resposta dada: galinha assada com farofa ressuscitando o ex-tropeiro e animais selados para a batalha. Fortunato decidiu primeiramente descobrir o nascedouro do sol, tendo em vista sua pontualidade diária frente à lua. Em seguida, o presépio da lua. Foram longas viagens sem sucesso algum, deixando-o cada vez mais obcecado pela procura. Apeava em uma montanha, olhava atrás dela e o sol nascia na outra montanha. Cavalgava para outra....o sol nascia na outra.... Sua família se preocupou com aquilo. Não duvidaram que o velho Fortuna batera a caçoleta. Os membros se reuniram e decidiram o ultimato: Interná-lo em um hospício no Rio de Janeiro! Coisas daquele tempo. Traçaram seu destino. Agora, vestido com um macacão botafoguense, Carlitos! Naquela barafunda o apelido pegou, pois não duvidavam do dito cujo; mesmo os menos loucos que em pleno sábado de aleluia se fantasiavam de santos. Comentava todos os dias: ainda vou descobrir onde nasce o sol e a lua! Imediatamente todos o apoiaram na façanha. Uns sem dentes, outros sem roupas, alguns sem unhas, mas todos sem juízo se dispuseram a ajudá-lo, custasse o que custasse. Chegou o carnaval no Rio: fevereiro em fogo no samba da moçada, no rodopio dos morros fervendo sob pandeiros e tamborins. Mulatas esbanjando bundas às redondezas. O vigia do hospício delirou sambando vestido de Zorro, transtornado de Tonto, tamborilando um jogo de chaves de forma eficiente a fazê-lo cair em mãos tresloucadas. Os loucos ganharam as ruas e se vestiram com fantasias perdidas pelas calçadas, aos montões. O hospício deu alerta pelas rádios que só tocavam samba e não era possível encontrar loucos no meio de milhares de napoleões, césares, fantasmas, duendes, arlequins, etc. Carlitos vestido de Lã Peão, com uma louca feia vestida de Maria Bestânia, após um fatigado dia carnavalesco, deitou-se nas areias da Praia de Copacabana. Quando o dia se ilumina, lá vem o sol de dentro do mar! O velho sorriu satisfeito. Resolveu passar mais um dia de carnaval com sua companheira naquela maravilhosa praia. A tarde veio caindo. Olhando em direção à praia, viu a bela lua cheia saindo de dentro do mar. No dia seguinte, conseguiu uma carona em um caminhão e voltou completamente curado para a sua terra natal. O enigma de sua curiosa esfinge estava descoberto. A família percebeu que ele não tinha mais a doença mental. Carlitos ficava sorrindo de feliz. Quando alguém lhe perguntava, "onde nasce o sol e a lua?", ele respondia calmamente: "seu moço, os dois nascem nas águas do mar da Praia de Copacabana!" Como nos velhos tempos infantis, vamos procurar a moral desta estória? Sim, o que as pessoas precisam é de um argumento que os consiga interpretar a realidade à altura de sua ingenuidade.

Transcedência

Naqueles tempos em que as flores se abriam em mil cores para os dias que se abriam em mil tons para o sol que se abria em mil raios, um mestre saiu em seu dia de folga para pescar em um oceano que se abria em mil ondas que saltitavam como crianças felizes de mil formas diferentes. Na primeira vez que o mestre lançou seu anzol a linha parecia pesada demais, enquanto ele dizia consigo mesmo, “creio ter fisgado um peixe de enormes proporções”; murmurava e firmava seus pés na areia, ia puxando a linha passo a passo e de nada mais do que uma velha proa de barco soterrado era seu achado e que se muito tivesse a contá-lo, estava ali para pescar e de novo lançou seu anzol em um semicírculo fazendo fundo com o horizonte e por incrível que pareça mais uma vez a linha apresentava um fardo fatigante à medida que o resgatava e sentia que vinha arrastando pelo fundo do mar nada mais que desta vez um enorme peixe, o que por surpresa sua não passava de uma âncora soterrada de um galeão espanhol e que teria muito a contá-lo dos piratas e seus amores pelos tantos mil mares, mas deixou-a um pouco mais acima na beira do manancial, murmurando, “há mais coisa entre o homem e o mar que uma vã pescaria possa pescar”; sendo como foi de sua decisão ir em busca de um bom peixe, não titubeou e de novo lançou seu anzol em forma de interrogação ao longo das saltitantes mil ondas e aguardou, pois como sempre afirmaram todas as lendas, grandes coisas estão a acontecer na terceira tentativa de um intento. Desta vez veio uma garrafa de tom anil escuro com o anzol atravessado em sua enorme rolha de cortiça endurecida a séculos e mais do que depressa puxou-lhe quando de sua boca enevoou uma fumaça que encheu toda a praia de cerração baixa; apresentando-se à sua frente um gênio dos contos das mil e uma noites e percebeu de imediato que sua fisionomia estava carrancuda, o seu olhar irado e sua expressão não era das melhores; uma vez que empunhava um sabre sarraceno dos mais afiados, que em um gesto rápido retirou da cinta e fixou profundamente o olhar do mestre, “fiz um juramento que aquele que me retirasse desta garrafa eu o mataria, pois logo após cumprir com os três pedidos que sempre me fizeram, mil vezes me enfurnaram nesta garrafa como agradecimento e agora chegou sua vez seu velho estúpido, pois matando-o, libertar-me-ei deste destino de encarceramento eterno”; enquanto o velho professor perplexo começou a pensar também sobre esta inusitada cena que estava vivendo, teria vindo à praia somente por lazer e não por se despedir da existência de uma forma tão terrível assim. Foi quando se lembrou já ter lido estória semelhante em que o gênio ameaçador se vê iludido por um espertalhão que após a grande ameaça e a suspensão do sabre, pergunta-lhe se ele realmente estava dentro daquela garrafa e se tinha certeza absoluta do que estava relatando, pois sendo um ser tão grande como poderia ter saído daquela garrafa tão pequena e o gênio que também era ingênuo, pois uma das leis do universo é a lei do movimento, gênio e ingênuo são faces de uma moeda, para provar ao ser questionado que havia saído daquela garrafa, pulou para dentro da mesma enquanto que o espertalhão arrolhou-a e de novo jogou-a ao mar, livrando-se da malevolência daquele gênio. Sabendo o professor que não veio a este mundo para enganar ou iludir qualquer um que fosse e que era de sua natureza educar e progredir a humanidade, decidiu desconstruir a maldade daquele ser irado e de início perguntou-lhe se alguma vez havia visto o mar, ao que o mesmo virou de costas e observou sua extensão infinita com seu beijo permanente no céu em seu fim; passou os pés pelas ondas que tocavam a praia e a enfeitavam com suas rendas brancas de espumas do vai e vem de sempre desde os tempos imemoriais; enquanto também lhe apontou uma orla de pinheiros que desfilava ao longo atravessado por um vento suave, ouvindo uma sinfonia de sons enquanto o mesmo soprava entre suas folhagens, assim como alguns pássaros cantavam e sobrevoavam seus píncaros; bem como por sobre eles vinham enormes martins pescadores que abaixavam seus vôos sobre o manto do mar para seus lanches tradicionais; assim o gênio voltou com outros olhos sobre o mestre, abaixou seu sabre, pediu-lhe perdão e agradeceu profundamente sua presença, pois desta vez conseguira realmente sair para sempre de sua garrafa, do seu ego que de egoísta passou para ser egoente. Desta forma, o mestre conseguiu que o gênio através da evolução do seu estado de consciência, se libertasse de sua prisão!

Ressonância

Enquanto uns plantam ramos secos exaustivos pelo chão, 
eu danço como Shiva eterno plantando polens ao vento!
Eu não escrevo poesias como muitos pensam! Não pensem isto de mim! 
Eu sou a própria poesia encarnada em minha liturgia diária! 
Por ter nascido acasalado assim, sei disfarçar-me em anabiose.
Sei bater palmas para Insensatos rimadores e tecelões de trapos poéticos, 
para escapar-me do tiro de arcabuz e fingir-me de argamassa enquanto por dentro 
moro na casa da Poesia com alma de arqueiro zen,
que sabe com um arco só e uma seta somente atirar 
em todos os alvos ao mesmo tempo, com um movimento sutil, 
porque não sou dono de nenhum argumento, sou a própria narrativa do Verso! 

sábado, 7 de setembro de 2019

Você 41


Ai quem me dera sair, caminhar neste momento, se pudesse,
com  minhas mãos enlaçadas, em prados de cachos dourados
nos vinhedos à primavera sorvidos a cada beijo que te desse,
sob pássaros a emoldurar canções nos nossos braços dados!

Embandeirados pelos caminhos cada arbusto com frutos viesse
colados em cabides, galhos resplandecidos de sumo ofertados,
tal se a nós dois o cosmos organizado do seu seio pretendesse
condecorar-te, celebrar teu corpinho com cânticos orvalhados!

Caudais de perfumes exalando promissores da fantástica natureza
envolvendo os contornos de nossas áureas com aromas milenares,
emolduram nossos passos, ornamentam teu manto belo, Princesa!

Visualizamos o horizonte em sua mais longínqua, divinal fronteira!
Porém, não há fim de estrada entre nós, somos ternos aos milhares
de quereres entre nós, diante de nós, se apequena uma vida inteira!

sexta-feira, 6 de setembro de 2019

A vida continua

Não, não pretendo falar daquela ponte com aqueles dois trilhos alongados, a partir de sua cabeceira, enquanto ela permanece gélida e calada como um imenso elefante cinza petrificado, mudo, silente, cálido em frente à savana. Também não quero falar do rio que passava por baixo, isto porque outro rio passava por cima do rio carregando os vultos dos pássaros do céu; mas daquelas águas correntes, cuja única realidade é a túnica estática das coisas aparentes, destas coisas todas em nossa volta que dão meia volta sobre si mesmas e sobre nós, enquanto nós não nos vemos passar por sobre os sulcos de nossas faces; pois, quanto a mim, o rio que passa por sobre o rio como um espelho do voo dos pássaros, é aquele tempo que passou dentro de mim e o rio que passa sem cessar, não é o tempo. Não, nunca será o tempo, porque não foi o tempo que deixou as marcas na minha face! Foi o fundo do rio, lá na sua mais densa profundidade, na sua mais distante e permanente quietude, onde nenhum poeta resolveu pisar para amassar seu lodo e desvendar o que está por detrás do seu palco, pois, é ali onde dorme em sono mais profundo tudo aquilo que foi pesado! Tudo aquilo que foi rejeitado, tudo aquilo que por não ter sido suportado não se deixou correr pelas águas do rio, mas que por outro lado, o que seria do rio se o seu fosso não o houvesse suportado? Quanto àquela ponte da qual não gostaria falar, agora, depois de escapar-me do meu esboço, posso interpretá-la de forma diferente! Não é na altura deste poema aquele pesado elefante! Ela se torna leve, leve como o girar de uma roda gigante sobre o parque de todos os acontecimentos! Ela me permite ir do fundo ao teto e deste a todos os momentos reprimidos, transcendendo-os como uma girândola colorida vai desfazendo todos os nós com mãos de afeto. E quanto àqueles trilhos além da cabeceira? Sim, desde o início eram vias de possibilidades, pois, eram de marfim! A verdade mais nua e crua, ou a maior de todas as verdades: a vida continua!

quinta-feira, 5 de setembro de 2019

Egoenada

Dizem que atrás das orelhas carregava um galho de arruda!
Queria ser tudo! Tudo! Tudo! Queria elogios às centelhas!
Tem gente que nasce mudo ou muda! Mas tem gente topetuda ou topetudo, pois tem de tudo neste vasto mundo! Tudo!
Afirmava-se como grande artista e se apresentava como celebridade!
Escrevia poesia de se perder de mal vista e atravessava a cidade declarando-se possuir o canto, a medicina, a literatura, assim como toda a arte teatral!
Muitos lhe aplaudiam de verdade, porque no senso comum, nem todos sabem diferenciar força daquilo que a nobre ciência chama de gravidade.
Um dia, houve um grande sinal! Partiu, pois todos partem bem ou mal.
Olhem que sobra o que ninguém viu!
Aquilo que realmente permanece na cena. O universo possui uma divina memória! Sabem quem coloca o ponto final? A História universal! Simplesmente implacável!
Guarda tudo que há de bom e vale a pena. Joga no esquecimento o que for descartável, seja no lixo da memória, seja no lixo cósmico! Nada é nada!

segunda-feira, 2 de setembro de 2019

Você 40


Modelar poemas para ti é como abrir grandes estradas
e convidar os polens matutinos prontos para germinar
pelas tuas curvas galantinas, por enebriosas enseadas
domáveis, graças andaluzes sempre a me contornar!

Perdido, retrógrado, retorcido em veredas retalhadas,
não encontrava o lúcido segundo côncavo a emancipar
durante o luzir diurno, um voo pleno de asas estreladas
por onde quimeras de alegrias me viessem esmerilhar!

Um instante supremo afiado como rápido espadachim
traçando milagrosamente no vácuo aquela espetacular
figura, no contraste da minha mente de você em mim!

Buscar na supremacia da grande possibilidade, a estadia
deste âmbito producente do espelho, onde pudesse mirar
cada coisa estampada, com este olhar que você me espia!

Realidade

Há coisas que nos fazem cair fora de si... Dependendo do vulto vale demais sonhar. Dependendo da penumbra nem vale a pena acordar. Acordar m...